Um
olho d’água libera transparência e ternura. Corre por um caminho só seu. E,
mais além, pode formar uma cachoeira que, por sua vez, faz nascer um grande e
belo rio. E o movimento é constante... é contínuo... presente de Deus. Assim
são certas pessoas. Nascem para trazerem ao mundo caótico, leveza,
transparência, beleza e som. Adenildo José da Silva é uma dessas pessoas que
propiciam alegria através da música.
Nascido
em Lagoa Comprida, pequeno Município de Bom Jardim, Pernambuco, ele conheceu o
acordeon entre os seus oito e nove anos de idade. Não foi paixão à primeira
vista, pois antes o menino fora seduzido e extasiado pelo som do piano. Sendo
assim, como nunca teve dinheiro para comprar um, encontrou consolo no fole e se
deu muito bem. O destino se definiu e o homem hipersensível traz a mansidão da
lagoa e o colorido do Jardim em seu nascedouro por designo da mãe natureza.
Morador
do Morro da Conceição há 7 anos, permite-se sair do anonimato, tornando-se
reflexo, referência e fonte de pesquisa.
Para
quem viveu e vive intensamente, 70 anos é idade de recém-nascido. Devoto de
Nossa Senhora da Conceição e São Jorge Guerreiro, Nido, como é popularmente
chamado, nunca deixou de preservar a verdadeira arte e as memórias dos tempos
pelos quais passou e passa.
Teletransportando-se
pela memória, aterrissa num tempo bem distante e nos conta que antes de
adentrar no mundo musical como profissional, foi fotógrafo por 16 anos. E
considera isso uma grande besteira que cometeu, pois sua musicalidade forte o
intimava sempre.
Pernambuco
esperava por Nido com urgência, pois acordeonista nos anos 70 era espécie em
extinção devido à morte por velhice dos poucos profissionais do fole.
Seguindo
o conselho do Rei do baião, Luíz Gonzaga, com quem gravou, tocou e conviveu, Adenildo
nunca mais deixou de puxar o fole com categoria. O rei ficou extasiado ao ouvir
o nosso Playmobil do mangue executar no acordeon uma música do Michael Jackson.
Thriller! Thriller! De lá para cá o massapê treme e a explosão de uma estrela
sempre acontece quando nosso artista sobe ao palco. Fomenta a boa cultura e
cerceia o que não presta. Dá pra tu ou quer mais?
Músico
autodidata, passeia sem dificuldades por entre o clássico e o popular. Esbanja
harmonia como só um gênio sabe fazer. Orgulho brasileiro, nasceu única e
exclusivamente com a missão de acompanhar grandes cantores e bandas. Ele é uma
estrela e, por isso, estar muito acima da órbita.
Pensar
que músico que toca forró e xote é limitado e analfabeto é mera ilusão. Tomo como
exemplos Luíz Gonzaga, Dominguinhos, Caçulinha e Nido, é claro. Todos
espécimes! Todos gênios! Todos clássicos! Todos brejeiros! Todos brasileiros!
Todos caboclos!
Artista
não pode ser limitado. Deve, sim, ser observador e ouvinte de outros artistas.
Foi isso que sempre fez e faz Adenildo. Ele ouve de tudo: Marvin Gay, Bee Guess, Pink Floyd,
Elton John, The Beatles, The Door, Debussy, Art Van Damme, Bill Evans, Oscar Paterson…
Dono
dessa versatilidade musical invejável, esse cidadão não deixou de ser simples e
humano. Sendo assim, o clássico e o profano se fundem e se confundem e a mesmice
se acaba.
No cenário musical pernambucano do passado tocou com o roqueiro Lula
Cortes, Don Tronxo, Tito Lívio, Pedro In e Carlinha Andrade, Roberto Frange e a
Torre, com as irmãs de Chico Buarque de Holanda, Zé Rocha que é considerado o
Gilberto Gil de Pernambuco... além de cantores da MPB como Alceu Valença, João do
Vale, Geraldo Azevedo, Gilberto Gil, Simone... Participou também da gravação do
primeiro disco do radialista Reinaldo Belo. “Na onda do fricote
Quem
vê Nido do Acordeom passeando pelo Morro da Conceição não imagina o quanto ele
é um patrimônio cultural de extrema importância.
Na
Estrada dos Remédio aqui, em Recife, funcionava a gravadora Rosenblitz. Nela
participou da gravação do disco do Luiz Gonzaga acompanhando o cantor na música
forró dos infernos. Composição de Lula Queiroga. O disco não saiu devido a
problemas com a gravadora. Porém, uma cópia do LP está em uma fita K7 na casa
do Nido. Eram os anos 70.
Também
nos anos 70 participou da Banda Zaratempô e Chapéu de Couro. Essa foi uma banda
de rock acordionado. Aquela ele considera o marco do movimento mangue Bit. Porém,
Chico Science teve mais ousadia e pensamento extremamente aguçado. Ou seja,
mais visão do campo mangue eletrocutado. Além de sorte de tempo. As bandas
Zaratempô e Nação Zumbi têm algo em comum: o baterista Pupilo.
Misturar guitarra com acordeon na década de 70 era uma atitude que o público Pernambucano não aprovava. Os músicos da banda Chapéu de Couro quase foram espancados várias vezes. Homem com Chapéu de vaqueiro tocando acordeon numa banda de rock, era uma afronta desmedida aos bons costumes. Pense! Como resolver essa questão? Arrumava-se qualquer pessoa para cantar forró e tudo voltava ao normal. Valia até um bêbado.
Nido
foi destaque no jornal O Globo, em 2006, por causa de suas harmonias quando
viajou com a banda Cascabulho ao Rio de Janeiro.
Hoje ele participa da banda
Vates e Viola.
Mestres,
reis e maestros do nosso Estado mesuram Nido. São eles: Spok, Forró, Duda,
Parrô, Clóvis Pereira...
Silva
diz que para um músico ser grande necessita executar Bossa-Nova, Jazz, Blue, Choro, Frevo, danças portuguesas...
Na
opinião dele, Pernambuco está bem servido com o talento de músicos como
Cezinha, Beto Ortiz, Mestrinho, Luizinho de Serra Talhada... Todos puxadores
excepcionais do fole.
Enquanto
musicaliza o desenvolver de vidas inseridas num universo encantado e lúdico,
tenho certeza que, se esses pequenos cidadãos, público especial de Adenildo, continuarem
a escutar boas músicas e terem uma boa formação escolar, poderão, quem sabe,
mudar a cara do Brasil, qualquer dia desses.
Para quem quer sentir a musicalidade
desse genial artista, em breve "o espelho da comunidade... mostrará
um vídeo e músicas tocadas pelo artista.
Tentei
resumir aqui o tudo no tudo. Descobri com isso que, quando esse acordeonista
chora, abre-se o teto azul do mundo e os anjos se aproximam. Agora sei, sem
sombra de dúvidas, por que São Pedro é guardião do Céu.
Por
tudo isso, Adenildo é mais do que merecedor dos nossos aplausos. Por gentileza
e obrigação, urgentemente, aplaudam-no!
Expediente.
Texto - André Santana
Fotografias e produção - Jesuel Santana
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